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Sinopse: |
Os deuses estão entre nós. E eles podem roubar a sua alma… ou seu coração. |
Durante a minha vida humana, eu tive que sobreviver. Quando finalmente achei que poderia sossegar e tirar meu irmãozinho do inferno que era a casa da minha mãe, eu morri. |
Só para acordar como uma valquíria na presença de quatro deuses incrivelmente deliciosos: |
Loki, o sarcástico e astuto. |
Thor, o jovial, mas perigoso. |
Baldur, o sonhador e compadecido. |
E Hod, o taciturno e reservado. |
Quando me invocaram, deixaram uma parte de si em mim, e agora terão que me ensinar a como lidar com esses novos poderes. Eu despertei com uma missão: Encontrar Odin, o rei e senhor deles que está desaparecido e apenas uma valquíria possui essa habilidade. Porém, as três que tentaram antes de mim, nunca retornaram. |
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1. |
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Aria |
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Eu adoraria dizer que morri de forma épica, entrando na frente de uma arma para defender a pessoa que eu amo em uma rua extremamente movimentada, ou ao menos de uma forma escandalosamente indecente, como caindo da sacada durante o sexo mais incrível da minha vida. Mas, na verdade, a minha morte foi terrivelmente simplória. |
Saltei da minha motoneta em uma rua barra pesada da Filadélfia e caminhei em direção a creche canina onde meu cliente me esperava. O sol escaldante do verão fazia o asfalto feder e eu apostaria que de cada dez caras parados ali na esquina, nove estariam armados e carregando algum tipo de droga por baixo de suas camisetas largas. Era difícil dizer o que era mais perigoso: a vizinhança ou o pacote que eu levava em minha bolsa carteiro. Oras, uma entregadora muito bem paga não fica questionando o que está carregando; só se certifica de entregar a mercadoria no prazo. |
Um dos brutamontes, cujo nome nunca soube, estava de pé atrás do balcão da recepção, e Gene se recostava na parede ao lado. Que benção! Ele se endireitou e me lançou um sorriso nojento, quando saquei o pacote embrulhado por fita adesiva de minha bolsa. |
— Ari, é sempre um prazer vê-la. |
— Gostaria de poder dizer o mesmo, Gene — respondi animada ao entregar o pacote para o brutamonte. Ele examinou em um aceno rápido e se inclinou para pegar meu dinheiro embaixo da mesa. |
Gemidos e ganidos viam da sala atrás dele, onde alguns poucos cãezinhos eram mantidos como fachada para seja lá o que de fato acontecia ali. Só sei que era melhor não perguntar. |
Gene piscou para mim. Aprendi há muito tempo que era possível ofender de forma bem sincera e direta, deixando o insulto subentendido, desde que o fizesse em um tom de voz leve e alegre. Cérebros como o dele não conseguiam discernir inteiramente entre o tom e o significado do que estava sendo dito. |
Infelizmente, a imbecilidade em seu cérebro também indicava que ele nunca se cansava de me cantar, mesmo sendo velho o bastante para ser o meu pai e tão puxa-saco que nem na sua melhor fase eu me interessaria por ele. Pro meu azar, ele também era primo de um dos meus maiores clientes, logo não poderia enfiar uma faca nele para que compreendesse a situação, mesmo querendo muito. |
Claro que não seria nada fatal. Só o acertaria em algum ponto bem dolorido para que entendesse a mensagem. |
Em vez disso, quando ele se insinuou em minha direção e tentou colocar o braço ao redor da minha cintura, o máximo que pude fazer foi desviar para o lado com um sorriso forçado no rosto. Minha mão alcançou o bolso traseiro do jeans, tirando conforto na pequena saliência provocada pelo canivete que eu não hesitaria em usar, caso realmente precisasse. |
— Ah, qual é, docinho — disse ele. — Você não pode aparecer por aqui desse jeito e recusar fogo. Vem que eu te mostro como se divertir. |
Tudo que eu vestia eram os meus jeans justos, não apertados, e uma camiseta branca larguinha com uma gola que mal beirava meu colo. Estava sem maquiagem, e meu cabelo loiro na altura dos ombros um pouco desgrenhado devido à motoneta. “Aparecer desse jeito” para o Gene era o mesmo que ser mulher e jovem. |
— Não duvido que consiga, Gene — respondi mantendo o sorriso. — Assim como também posso te mostrar meu punho quebrando o seu nariz. Mas acho que podemos evitar isso e continuarmos amigos, não é? |
Gene franziu o cenho e me olhou de forma questionadora. Ele tentou se aproximar novamente de mim e levantei meu punho, arqueando uma sobrancelha. |
— Fui por três vezes campeã de boxe na escola — acrescentei, ainda com a voz doce, mas lançando um olhar mais intenso. — Você realmente está a fim de me testar? |
Gene me avaliou e decidiu se afastar para manter a ilusão de que eu, algum dia, iria ceder a seus avanços. |
Nunca na minha vida lutei boxe, mas já dei uns bons murros por aí, então o que eu disse não era tecnicamente uma mentira. |
O brutamonte enfim me entregou o maldito envelope. Contei as notas por alto, lancei meu “muito obrigada” e enfiei o dinheiro na minha bolsa quando me dirigi à porta. |
Fora uma boa quantia, e no decorrer da semana tinha feito uma grana decente. No final de semana, talvez eu conseguisse comprar alguma coisa para o Petey. Claro que era impossível dar a ele metade das coisas que eu desejava, pois deveria ser algo bem pequeno para que nossa mãe não notasse. Quem sabe um pacote daquele jogo de cartas que ele se viciou e alguns docinhos; ou talvez um novo par de tênis, para substituir aqueles surrados, que ela deveria ter percebido que não cabiam mais nos seus pés? Se eu os encardisse um pouco, talvez ela nem notasse que eram novos… |
Imaginar o sorriso do meu irmão mais novo era o antídoto perfeito para a atenção indesejada do Gene. Um sorriso genuíno surgiu em meu rosto, ao mesmo tempo que meu peito se apertava. |
Joguinho de cartas e sapatos novos não eram o suficiente. Nada nunca seria o bastante se minha mãe seguisse… bem… do jeito que ela era. Se a vida do Petey se transformar na metade do pesadelo que a minha um dia fora… |
Chacoalhei tais pensamentos para longe. Eu fazia tudo ao meu alcance, apesar dela. Eu jamais permitirei que alguém o machuque. E, quando eu conseguir juntar dinheiro o suficiente para ter uma casa legal e enfim contratar o melhor advogado da cidade, eu batalharei até o fim para tê-lo comigo. |
A batida chiclete de uma música pop invadia a rua, quando passei pela porta aberta do mercadinho ao lado. O leve gingar ritmou meu caminhar, enquanto me dirigia à lambreta. Talvez eu devesse sair para dançar hoje à noite, espairecer um pouco a cabeça antes de começar tudo de novo. Já fazia um tempo. |
Ao atravessar a rua, eu não olhei para a esquerda, pois era uma via de mão única. Mas, quando eu já estava no meio da rua, um jipe amarelo surgiu por detrás da esquina, mais rápido do que qualquer pessoa em sã consciência seria capaz de dirigir, mesmo indo na mão correta. |
O motorista gritou. Os pneus cantaram. Eu me joguei para calçada do lado oposto. |
O que teria me salvado, se o cara atrás do volante não estivesse tão drogado a ponto de tentar não me acertar, jogando o carro na minha direção. |
Eu ouvi, tanto quanto senti, o estalo nauseante da grade acertando a minha lateral. A agonia explodindo por todo o meu corpo. Minhas pernas cedendo. O canto do para-choque acertando a minha cabeça com um estalido de rachar o crânio. |
O barulho confuso e cacofônico ao meu redor fora engolido pela onda de dor que me invadia. Quando minha visão começou a escurecer, e a luz ao meu entorno desaparecer, consegui me prender no pouco de consciência que me restava para pensar: “Cuzão filho da puta com seu jipe de merda.” E então, “Quem vai cuidar do Petey? Ele nem vai saber por que eu morri.”[J1] |
Uma pontada firme e penetrante de angústia cortou a dor crescente. Mas ela não bastou para me manter ali. |
A onda me atingiu de novo e se arrebentou, me arrastando para as profundezas, cada vez mais fundo, até simplesmente não restar mais nada. |
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As pálpebras tremeram. |
As minhas pálpebras tremeram. |
A consciência começou a varrer meu corpo naquele momento. Uma sensação de formigamento, através da dormência, em minhas bochechas e minha testa, descendo pelo pescoço, por meu peito e meus membros. |
Eu tinha membros. Eu tinha um peito. Um peito que não queimava mais com a dor excruciante. |
A minha cabeça ainda estava confusa. Pisquei e as cores dançaram em meus olhos. Um arrepio provocou minha pele e senti minhas costas pesarem de modo estranho, mas fora isso, nada parecia errado. Será que alguém me levou para o hospital? Talvez os medicamentos estivessem deixando minha mente e olhos confusos. |
Pisquei mais uma vez e as cores se fundiram em formas. As formas se moveram. Consegui focalizar duas, as mais próximas. |
Dois homens, ambos altos e fortes, apesar de um ser mais parrudo do que qualquer outra coisa, com cabelos castanhos-avermelhados, e o outro ser mais esbelto, o cabelo com um ruivo mais claro. Aqueles rostos perfeitamente esculpidos, maxilar protuberante e mais quadrado em um, e no outro elegantemente mais pontudo… Se isso aqui era um hospital, estava mais para a versão Hollywoodiana dele. |
Os dois me encaravam atentamente. O parrudo deu outro passo à frente, segurando um lençol branco como se o oferecendo a mim. Para mim? Porque… |
A minha consciência se aguçou, conforme a minha mente se focava mais em meu corpo. Na minha pele ligeiramente arrepiada, justamente, por eu não estar vestindo nada. Estava deitada, completamente nua, sobre alguma superfície acolchoada no centro dessa enorme sala amarela, com dois homens estranhos e com o dobro do meu tamanho se aproximando. |
Uma pontada gélida de pânico disparou por meus nervos. Meus braços e pernas se convulsionaram, quando enfim retomei o controle através de meu estupor. Eu me arrastei pelo chão, forçando uma certa distância dos dois homens. |
Não, não eram apenas dois. Havia dois outros em pé, apoiados no fundo da sala, e uma mulher, todos me observando. O peso estranho nas minhas costas me fez vacilar, quando posicionei minhas pernas sob meu corpo e, com os braços apoiados no chão, tentei me levantar. |
— Ei, calma aí! — disse o parrudo com sua voz grave de barítono, balançando o lençol na minha frente como se chamando minha atenção. Como se eu fosse um cachorro atrás de um biscoitinho. — Está tudo bem. Ninguém aqui vai te machucar. |
Ahã, certo. Porque sempre dá para confiar em alguém que faz uma promessa dessa. |
— Que porra está acontecendo? — questionei, me abaixando para me cobrir. — Onde eu estou? |
— Bem diferente dos demais experimentos, não é? — indagou sarcasticamente o mais esbelto, olhando para os outros ao redor da sala. Seu olhar caiu sobre mim e ele inclinou a cabeça. — Um pouco menor do que eu esperava. Quase uma fadinha. |
Eu não tinha a mínima ideia do que ele estava falando, mas não gostei do comentário dele. Cerrei meus dentes e os músculos dos meus ombros se flexionaram com a tensão. |
— Não me provoque. |
— Quanta disposição! — sorriu ele, esperando que eu me rendesse à brincadeira. |
— Dê um tempo para ela se ajustar — cortou o parrudo. — Nós temos que deixá-la mais confortável. |
Franzindo o cenho, ele pegou o lençol e ofereceu novamente para mim. |
— Tem certeza de que não vai querer isso? |
— O que eu quero é que me falem como em vim parar aqui, e que porra toda é essa que está rolando! |
Meu olhar recaiu sobre a porta no final da sala. Eu poderia correr até lá. Claro que eles eram maiores e mais fortes que eu, mas eu era rápida. E eles não pareciam esperar que eu tentasse fugir assim, logo teria o elemento surpresa a meu favor. |
— É um pouco complicado — respondeu o Esbelto. — Por que você não tira um minutinho para relaxar e se recompor, e depois a gente entra nos detalhes mais sórdidos? |
Um riso áspero explodiu de minha garganta. Relaxar? Ele estava zoando? |
Olhei novamente para a mulher, quase tão alta quanto os rapazes e tão bela em sua aparência. O rosto dela era impecável como o de uma top model, adornado pelas ondas cor de mel de seu cabelo. Que tipo de pessoas eram essas? |
Será que ela me ajudaria ou estaria apenas planejando me deixar à mercê desses homens? Ou até se juntar a eles no que eles tinham planejado? |
Ela devolveu meu olhar, apertando mais a boca. Pensei ter visto um pouco de simpatia em sua expressão, mas ela não falou nada, tampouco se mexeu. |
Então, estava à mercê da minha própria sorte. |
Os demais estavam ainda de pé nos fundos da sala, perto de grandes janelas em arco. Não muito perto da porta. O parrudo deu mais um passo em minha direção. |
Quanto tempo mais até ele tentar se impor? Eu tinha que sair daqui, e tinha que ser agora. Eu me lancei para frente pelo piso de madeira encerado. |
Se o meu corpo estivesse funcionando como de costume, o esforço teria me impulsionado e eu teria cruzado metade da sala em algumas breve passadas. No entanto, minhas escápulas doeram como se algo as estivesse puxando e aquele peso nas minhas costas me fez tombar para o lado. Que porra era essa pendurada em mim? |
Meu ombro trombou com a parede. Em um piscar de olhos, o Esbelto estava à minha frente, impedindo minha passagem. E o maldito ainda estava sorrindo. |
Meu punho voou, mais por instinto de sobrevivência, do que por achar que eu teria alguma chance lutando contra ele; e ele riu descaradamente. Vacilei um pouco para trás e tateei minhas costas na tentativa de desenganchar o que quer que estivesse me atrapalhando. Meus dedos roçaram de leve a superfície suave e enrugada de algo que minha mente não conseguia assimilar. |
O Parrudo se aproximou de mim pelo outro lado, ainda segurando a porra do lençol. |
— Vai se foder! — Eu disse quase rosnando. Desvencilhei-me para o lado e o Esbelto me seguiu, seus olhos brilhando animados. |
— Muito diferente das outras — murmurou ele. — Gostei. — Relanceando por sobre o ombro complementou — Ei, sobrinho, acho que é melhor dar uma apagada nela por um tempo, para que possamos deixar as apresentações para depois. |
Me apagar? Um dos outros caras, um pouco mais baixo que o Parrudo e o Esbelto, mas ainda bem constituído fisicamente, cruzou o cômodo em nossa direção. Sob a cascata desalinhada de seus cabelos platinados, os olhos azuis eram vívidos e, estranhamente, sonhadores. Seus olhos encontraram os meus, mas sua expressão não indicava que tinha notado meu desespero. Um arrepio percorreu meu corpo. |
Não. Eu não poderia deixá-los me prenderem aqui. Eu não me permitiria ficar indefesa. |
Novamente, tentei me lançar em direção à porta, lidando melhor agora com o peso ao qual estava começando a me acostumar em minhas costas. O Esbelto estendeu a mão para me agarrar. No entanto, ele não me tocou, pelo menos não tocou em nenhuma parte do meu corpo que eu conhecia. Um choque me atingiu pelas minhas costas, como se ele tivesse agarrado um membro que eu não sabia que possuía. Isso me fez estancar ali mesmo. |
Minha cabeça virou. Nada daquilo fazia sentido. |
— Que porra você está fazendo comigo? — questionei tentando lhe dar outro soco. |
O Esbelto desviou elegantemente dando um passo para o lado, ainda segurando aquela parte do meu corpo que não deveria existir, que não estava ali antes. Ele me deu um breve sorriso. |
— Nós lhe trouxemos à vida novamente, fadinha — respondeu ele. — Fizemos de você uma Valquíria. |
Ele puxou levemente o membro inusitado e, então, vi pelo canto do olho: o irromper de uma enorme asa com penas branco-prateadas. Uma asa que os dedos dele envolviam com uma pressão que eu conseguia sentir por toda extensão até sua carne encontrar a de minhas costas. |
Um grito abafado deixou meus lábios e, então, o homem com olhos sonhadores adentrou meu campo de visão. Suas mãos seguraram minha cabeça. Antes que eu pudesse tentar me defender, um leve entorpecimento enevoou a minha mente, levando consigo os homens, aquele cômodo e todos os meus estarrecimentos para um vazio acolhedor e brilhante. |
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2. |
Thor |
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A garota desmoronou com o toque do Baldur, suas pálpebras fechando e sua cabeça pendendo para o lado. Me joguei à frente para pegá-la, antes que seu corpo atingisse o chão. |
Ela parecia tão durona um momento atrás; pequena, sim, mas forte com seus pequenos músculos e flamejando com sua fúria; que a maciez de seus braços relaxados me surpreendeu. Eu a coloquei no chão e a envolvi com o lençol que tentei oferecer antes. Ela não tinha gostado de aparecer nua na nossa frente. E não precisou falar nada, era possível deduzir. |
Suas asas estavam se encolhendo com o leve farfalhar das penas, contraindo-se para dentro do seu corpo, até ela forçá-las novamente para fora. Se ela conseguisse chegar até lá. Minha boca se retorceu, conforme afastei um cacho de seu cabelo loiro de seus olhos fechados. |
Ela agora parecia tão tranquila, mas uns minutos atrás estava completamente aterrorizada e, acima de tudo, furiosa. Nós tínhamos aterrorizado ela. Por que, em nome de Asgard, eu não tinha me preparado para isso? Talvez as anteriores tivessem sido de fato as estranhas, ainda presas àquela confusão inicial, pacientes o bastante para ouvir nossa história e presenciar quem e o que nós éramos. |
Mas os humanos, todos eles, eram minha responsabilidade, mais do que de qualquer outro aqui. Eu sou o guardião da humanidade. E os últimos cinco minutos mostraram como falhei miseravelmente nesse dever. |
Loki se aproximou ao meu lado, esfregando a ponta do queixo enquanto estudava a garota. Seus olhos brilhavam. |
— Bem, eu realmente prometi que essa seria diferente, não foi? Essa é uma lutadora, daquelas. |
— Uma boa por sinal — admiti. Estive em inúmeras batalhas para reconhecer experiência e habilidade quando visse, mesmo na forma de uma mortal. — Foi promissor vê-la. Mas é claro que seria melhor se ela atacasse nossos inimigos, não a gente. |
— Estou certo de que assim que explicarmos de forma apropriada sobre nós e nossos inimigos, enfim poderemos deixá-la do lado certo. |
— Oras, e está tão certo disso, é? — destilou Hod de onde ele estava parado com os braços cruzados perto das janelas. Sua expressão tão sombria, quanto o preto de seu cabelo curto. — Do mesmo jeito que você tinha tanta certeza de que essa sua nova ideia “brilhante” ia dar certo? No momento em que ela acordou, pude ver o começo de um enorme problema. |
A luz nos olhos de Loki faiscaram um pouco mais brilhantes por um instante, mas ele lhe respondeu com seu tom sarcástico de sempre. |
— E desde quando você consegue ver o que está bem na sua frente? |
O semblante de Hod endureceu. Depois de séculos de prática, ele conseguia mirar seu olhar cego, de acordo com a voz do Loki, de modo tão preciso que qualquer um acreditaria que ele era capaz de ver o trapaceiro. |
— Você entendeu o que eu quis dizer. O uso da semântica não muda o fato. |
— Se o sucesso de cada grande empreitada fosse julgado nos cinco primeiros minutos, a civilização seria algo completamente desolador. |
— Ela está bem, por ora — disse Baldur ao meu lado, sua voz tão lenta e melódica como de costume. Tão brilhante quanto o seu gêmeo era taciturno. — Eu acalmei a mente dela. |
— Está bem — afirmei ao afastar meus pensamentos dos meus irmãos mais novos e de nosso companheiro trapaceiro, para poder retomar o assunto em questão. — Precisamos achar um jeito de deixá-la mais confortável, assim ela estará com um humor melhor ao acordar de novo. |
Freya se aproximou e gesticulou graciosamente com o braço. |
— Leve-a para um quarto normal. Depois, vamos arranjar algumas roupas para ela. Algo para comer também. E, talvez, dar um tempinho para ela ficar sozinha, antes de ter que enfrentar vocês todos de novo? |
Loki riu, mas não contestou. Hod parecia contente o bastante por ter se livrado do problema, e Baldur… Bem, era difícil dizer o que se passava em sua cabeça nesses últimos dias. Nada parecia penetrar aquele brilho onírico à sua volta. De qualquer maneira, ele não pareceu incomodado com a sugestão. |
Relaxei meus braços ao redor da garota e a levantei. Dormindo, ela não parecia sentir nada. Mantendo o lençol bem preso ao seu corpo, pousei sua cabeça e ombros em meu ombro largo, e a carreguei pelas escadas. |
Freya me seguiu. Enquanto colocava a garota na cama do quarto em que as demais valquírias tinham usado pelo brevíssimo momento que estiveram conosco, a deusa abriu o guarda-roupa e analisou o que estava à disposição. Ela pegou uma blusa de seda branca e um par de calças de linho cinza, dobrou-os e os colocou em uma pilha arrumada com algumas roupas íntimas ao pé da cama. Então, ela se levantou e contemplou a garota. |
— Você acha que devíamos ter escutado ele? — perguntei. Ela sabia de quem eu estava falando. |
— Loki já nos livrou de mais problemas do que nos meteu, — começou ela. — Por mais… questionáveis, que sejam os seus métodos. Tudo bem que as primeiras tentativas não vingaram. |
— Pois é. — Meu maxilar retesou quando recordei as outras jovens que haviam dormido naquela cama. Que estiveram em nossa presença por alguns dias e então… |
Nem conseguimos saber o que de fato aconteceu com elas. Jamais retornaram. E isso já dizia tudo. |
— Se aquele trapaceiro é leal a alguém, com certeza é ao Odin — complementou Freya. — Ele quer encontrá-lo tanto quanto a gente. De qualquer modo, estou certa de que ele não teria sugerido algo que fosse piorar a nossa situação. |
— Verdade seja dita. — Depois de todo o tempo que passei junto ao Loki, depois de todas aquelas enrascadas que ele me enfiou no decorrer de nossas vidas, eu ainda não conseguia ter ideia alguma de como aquela mente bizarra, mas inteligente, funcionava. As Nornas[1] sabem que eu, por exemplo, não consegui pensar em nada melhor. |
A deusa soltou um suspiro. Olhei para ela, tirando um pouco meu foco da nossa valquíria. Eu poderia chamar aquela mulher de madrasta, se não fosse tão ridículo para um marmanjo que já tinha séculos de vida quando o casamento aconteceu, chamar a esposa de seu pai de madrasta. Às vezes, era difícil até mesmo considerar Odin como meu pai. Principalmente, quando não estava em sua imponente presença. |
Eu deveria estender a cortesia à ela. Pelo menos, como membros da mesma família e, bem, como deuses encalhados nesse plano terreno. Não é que eu não gostasse da Freya. A gente só não tinha muita coisa em comum. |
— Está tudo bem com você? — perguntei. |
O olhar de Freya me percorreu e seus lábios torceram em um breve sorriso, como se ela tivesse notado meu esforço ao conseguir chegar àquela pergunta. |
— Suponho que eu esteja bem, apesar de tudo. Não é como se eu não estivesse acostumada aos sumiços do seu pai. |
— Mas ele nunca ficou tanto tempo assim longe. |
— Nunca mesmo. — Ela balançou a cabeça e se dirigiu à porta mostrando sua irritação. — Eu vou buscar alguma coisa para ela, já que, aparentemente, os outros três nesta casa não querem ser incomodados. |
Eu não sabia mais o que fazer, além de aguardar ao lado da cama. As sobrancelhas da garota franziram em seu sono. De repente, ela não parecia mais tão tranquila. O que mais eu poderia fazer para que ela se sentisse mais segura ao acordar? |
Peguei a pilha de roupas e a deixei mais perto dela na cama, para que fosse a primeira coisa que visse. Não parecia ser o suficiente, mas foi a única coisa que me passou pela cabeça. |
Freya retornou logo depois com um copo d’água e um prato com uma maçã e alguns biscoitos. |
— Trouxe umas coisinhas para ela se alimentar — comentou ela quando ergui minhas sobrancelhas. — Nem todo mundo consegue comer um assado inteiro, a qualquer momento, como o insaciável Thor. |
— Fique sabendo que o máximo de assados que consegui comer em um dia foram cinco — respondi. Claro que não entraríamos em detalhes sobre as demais coisas que comi naquele dia. Minha barriga roncou. Acho que era melhor beliscar alguma coisa para me segurar até a janta. |
Freya soltou uma breve risadinha e a jovem se remexeu na cama. Os lábios dela se abriram em um murmurar, os dedos apertando o travesseiro, o qual eu pousei sua cabeça. A deusa e eu ficamos imóveis. |
— É melhor deixarmos ela sozinha — sussurrou Freya. — Não acho que ela ficará feliz em nos ver ainda. |
E deixar a garota sozinha nesse quarto estranho em uma casa estranha a ela? Meu corpo estancou no lugar. Mas, por outro lado, ver uma pessoa estranha no quarto iria ajudar em alguma coisa? |
— Está bem — concordei —, mas precisamos ter certeza de que vamos fazer tudo certo dessa vez. |
— Com todas as outras nós tentamos fazer tudo certo — murmurou Freya, conforme deixávamos o aposento. E um bolo, que nada tinha a ver com a fome que sentia, começou a se formar em minha garganta. |
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Quantas novidades, e tem para todos os gostos... Mas no momento estou focada em completar minhas séries que estão incompletas, os lançamentos vão ter que esperar rss.
ResponderExcluirBjos!
Cheio de lançamentos top.
ResponderExcluirWishlist aumentou
Olá Rudy!
ResponderExcluirMuitos livros bons, fiquei de olho nos livros da Editora Vida e Consciência, muitos livros com preços bons!!
A dona Dark me quebra rs mas resisti e não comprei nada ainda rs Mas estou de olho no novo livro César Bravo, isso é óbvio!
ResponderExcluirNamorar não paga né? rs
beijo
Angela Cunha Gabriel