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Sinopse: |
E se o vampiro se apaixonar por alguém que só tem a metade da idade dele?
Cornelius Van Hoyk, dos Van Hoyk de Amherst é um vampiro. Mas a vida dos mortos-vivos não é nada glamourosa, como os mortais costumam pensar. A eternidade é... bom, uma eternidade. Dorothy é uma avó muito preocupada. Quando sua neta, que inventou depois de adulta que se chama Panthora, chega em casa com um bonitão falando um monte de coisas sem sentido, ela sabe que terá trabalho para salvar a neta de mais essa enrascada. O que Dorothy não esperava é que ela mesma fosse entrar em uma confusão que envolve assassinato, mortos-vivos e, quem sabe, uma segunda chance para o amor.
Presas, pra que te quero? é um romance vampiresco surpreendente e divertido. Impossível não ler com um sorriso no rosto.
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CAPÍTULO UM |
Cornelius Van Hoyk, dos Van Hoyk de Amherst, estava cansado de mulheres devoradoras de homens, antes mesmo de ser literalmente um homem devorador de mulheres. Nascido em uma época de grandes transformações na sociedade, guerras e transitabilidade social por meio do casamento, lhe foi apresentada a oportunidade de uma vida imortal. Como um vampiro sugador de sangue, ele seria capaz de livrar-se das amarras sociais e das inúmeras pretendentes que sua mãe passara a lhe apresentar. Uma proposta muito mais do que tentadora para não aproveitar. Só depois de se tornar membro da comunidade dos mortos-vivos, que ele percebeu que os mortais não tinham noção alguma do que a imortalidade realmente representava. |
Einstein chegou bem perto com sua explicação sobre a relatividade. “Quando um homem se senta ao lado de uma mulher bonita por uma hora parece que passou um minuto. Mas se ele se sentar em cima de um fogão quente por um minuto parece que passou mais de uma hora.” |
Quando você tenta, por uma noite, exaustivamente seduzir uma mulher indicada por seu vampiro mestre com uma conversa recheada de afrontas sem sentido e elogios rasos... Isso era algo eterno. É exasperador por quanto tempo uma beldade egocêntrica conseguia tagarelar sobre coisas irrelevantes e efêmeras. |
Verdade seja dita, Panthora Leigh não parecia ser má pessoa. As mulheres que o Brutus escolhia para ele quase nunca eram ruins. No entanto, ela era tão superficial que nem com microscópio seria possível enxergar uma profundidade nela. Cornelius compreendeu imediatamente o infortúnio que lhe aguardava assim que se encontraram do lado de fora do Terra Descura, que Panthora lhe informou ser “vegano, orgânico e só com ingredientes locais”. Se alguém desejasse se encontrar com um vampiro, não deveria sugerir um estabelecimento que se vangloriava pela falta de opções carnistas no cardápio. Com sorte, o menu que interessava Cornelius não era o que lhe fora entregue pelo maitre no terno fajuto, mas o que se sentava ao outro lado da mesa usando um vestido tubinho igualmente fajuto. |
Falando disso... os mortais se tornaram tão insensíveis aos ventos gelados a ponto de uma mulher jovem conseguir andar pelas ruas com tão pouca roupa? Na sua época, qualquer donzela que se apresentava de tal maneira o fazia somente nas áreas mais obscuras da cidade e jamais com a intenção de ostentar aqueles trapos por muito tempo. |
— Alguma sugestão? — perguntou Cornelius ao analisar as opções limitadas. |
O cardápio de Panthora ainda estendido sobre a mesa. |
— Não faço a mínima ideia. Nunca tinha vindo aqui. |
— Desculpe, achei que... como você mesma sugeriu o lugar... — disse ele com um sorriso forçado surgindo em seus lábios. |
— Eu nunca conseguiria pagar um lugar como esse — cortou ela de forma zombeteira. E retomou sua atenção para o cardápio. — Mas a Didi Filmore disse que o tartare de tofu daqui é de comer rezando. |
— Desculpa, quem? — retorquiu abaixando o cardápio e levantando os olhos. |
— Ai meu Deus, você não sabe quem é a Didi Filmore? Ela é apenas a blogueira de culinária vegana mais famosa do país. Você tem que seguir. |
— Seguir para onde? |
— Na internet? — zombou incredulamente. |
— Então, ela relata o dia a dia dela na rede mundial de computadores — disse enquanto apontava um item no cardápio para o garçom que acabara de chegar e se aproximar. — Sim, já ouvi falar disso. Desculpa minha ignorância, eu não passo muito tempo na... como se diz, a entre redes de informações? Apesar de entender completamente o quão conveniente é ter tudo de forma facilmente acessível em um telefone de bolso. Pode me chamar de luddista, mas ainda prefiro meus materiais de leitura em um papel. |
— Te chamar de quê? — indagou Panthora piscando incessantemente. |
— Luddista? |
— Eu não rotulo as pessoas, Corny... — respondeu ela enfiando o garfo na salada de entrada disposta a sua frente. |
— É Cornelius, na verdade. |
— ...eu não acho que os luddistas gostem de que o nome deles seja usado de forma pejorativa. |
O rosto de Cornelius se contorceu quando o garçom colocou a vasilha de verde salpicada de roxo, vermelho e branco a sua frente. Ele não tinha interesse algum por aquele verde, mas as demais cores o fizeram recordar de uma culinária mais requintada: uma com o sangue de uma jovem donzela e a doce sensação da submissão dela conforme suas presas perfuravam o pescoço. O sangue alimentaria seu corpo e a energia coletada pela entrega dela iria fluir através dele e saciar seu mestre. |
Engraçado que, dos mais variados rumores criados pelos mortais acerca do vampirismo, ele jamais encontrou um que de fato dava indícios que isso se tratava de um esquema de pirâmide. Talvez o esquema original, pois como o próprio mito do vampiro sugere, suas origens são tão antigas e longínquas que a própria Terra desconhece. Desde os primórdios do tempo, os jovens e belos eram atraídos para o esquema por um mestre carismático, alguém que prometia a vida eterna pela submissão de sua vítima, uma vez ao mês. Panthora era apenas a mais recente conquista de Cornelius em seu século e meio cortejando as mais complacentes beldades pelas costas recém saídas da guerra civil da Nova Inglaterra. A menos, essas costumavam ser mais complacentes. Sua última conquista lhe mostrava o quanto a cultura havia mudado. Era como um abismo entre eles, as últimas mulheres as quais lhe fora incumbido não eram sofisticadas tampouco ternas, além de confundirem opinião própria com erudição o que as tornavam, no fim, teimosas, presunçosas e materialistas. |
Mas isso não tornava o sangue de Panthora menos delicioso. Só complicava a obtenção dele. |
Cornelius sorriu ao pigarrear. Bom, era hora de tentar uma tática diferente. Se ele queria manter o bom humor de Panthora, então não seria uma boa ideia corrigir a ignorância dela. |
Pegando o garfo disse: |
— Está certa. Me desculpe. Receio que o tempo que trabalhei na América Central tenha me afastado das normas sociais de hoje em dia. |
— Que tipo de trabalho? — sua aversão claramente exposta. |
— Ah, algumas boas ações. Na última vez, ajudei a construir uma escola bem no meio da floresta. Acho que até acabei enferrujando um pouco meu linguajar, mas foi um preço a pagar por fazer o bem. |
Ele achava que alguém que seguia as publicações de culinária local de uma esnobe seria facilmente seduzida por trabalho humanitário, e parecia que havia acertado em cheio. As feições retesadas de Panthora se relaxaram. |
— Nossa, que legal... — completou com seu olhar distante. — Construiu uma escola, foi? |
— A primeira da aldeia — ele se inclinou um pouco. — Sendo sincero? Eu estava ali me voluntariando, mas fui eu quem realmente aprendeu com tudo isso. O que aquelas crianças me ensinaram com seus sorrisos e agradecimentos! |
— Estou certa de que eles realmente adoraram o que um estrangeiro rico procurando aliviar sua culpa com uma construção insignificante fez. |
A audição de Cornelius era superior à de qualquer mortal, mas as palavras que ouvira não pareciam fazer sentido. |
— Como é que é? |
— Você é realmente o tipo de pessoa que acha que vai ajudar os pobres quando invade uma cidadezinha e constrói uns poucos e míseros prédios? Paredes vazias sem meios! Você não aprendeu nada com a #PobrezaInstitucionalizada? — encarou-lhe Panthora com um olhar ácido e penetrante. |
— Receio não estar familiarizado com o conceito. |
— É lógico que não — disse pegando o guardanapo de seu colo e cobrindo o resto de sua salada, afastando o prato como se fora ultrajada. — Sabe de uma coisa, Corny... |
— Cornelius. |
— ...não acho que isso aqui vai dar certo. Mesmo você sendo gostoso, eu não vou desperdiçar meu tempo com um preconceituoso elitista. |
— Eu sou elitista? Só porque tirei um tempo para viajar com meu próprio dinheiro e ajudar os pobres? — encarou-a com os olhos arregalados. |
Ele não tirou tempo algum, nem ajudou ninguém, mas a questão era o princípio da coisa. |
Cruzando os braços e afrontando ele, ela continuou: |
— Não, é porque você acha que você é a solução de todos os problemas do mundo. Assim, você me buscou na sua SUV. Uma SUV, pelo amor de Gwyneth Paltrow — batendo a mão na mesa —, e nem era um desses híbridos! |
— Quando nós marcamos esse encontro você me disse que não tinha um carro. Eu caminharia com prazer os quase três quilômetros da sua casa até aqui! |
Cornelius se concentrou novamente ao perceber que havia elevado a voz e atraíra o olhar de alguns outros clientes. Deu uma tossida para disfarçar, se inclinou sobre a mesa e suavizou seu tom de voz, tentando se lembrar da recompensa que estaria por vir. Ele até poderia lhe roubar o sangue, mas a submissão dela só se daria por galanteios. |
— Panthora, por favor... — pegou uma mão dela nas suas, acariciando o dedão sobre as juntas dos dedos. — Eu confesso todos os meus pecados. Confesso que não estou a par das inúmeras mudanças normativas, tampouco consumo quaisquer mídia social e, geralmente, não me inteiro da moda ou tendências sociais. Mas, também, sou abastado e isso resulta na minha capacidade de ajudar as pessoas, sem levar em consideração se tal ajuda é o que eles realmente precisam, ou no caso, desejam. |
A fortaleza por ela erguida começou a desmoronar, os ombros reduzindo a tensão. Cornelius aproveitou o momento e alcançou a outra mão dela. |
— Você pode perdoar a minha ignorância, doce dama? Às vezes eu me esqueço que alguém privilegiado como eu, pode agir de uma forma condescendente. |
Quando um dos cantos da boca dela se ergueu, ele se preparou para sua cartada final. |
— De fato, foi rude da minha parte supor que pagaria toda a refeição, sem pensar que ao fazê-lo eu estaria estabelecendo uma dinâmica de dependência entre a gente, e que isso te deixaria... |
— O quê? — indagou retirando bruscamente suas mãos das dele. |
— O jantar — repetiu ele. — Eu devia ter pedido ao garçom que separasse nossas contas logo no começo para que pudéssemos nos sentar como iguais e... |
— Acho que você deve me levar para casa agora. — Seus cachos loiros esvoaçando conforme Panthora se levantava. |
Antes que Cornelius pudesse falar alguma coisa, ela se afastou da mesa e correu para fora do restaurante, esperando-o na rua. |
A volta para a casa que Panthora dividia com a avó foi permeada por um silêncio devastador. Por inúmeras vezes, Cornelius iniciou uma conversa, apenas para se deparar com um indicador apontado em sua direção. Enfim encostou o carro à porta da casa dela, estacionando no mesmo local em que estivera uma hora antes, quando ainda havia esperança. O próprio deserto ártico se congelaria com a frigidez dela agora. |
— Panthora, se me permite.... |
Ela saiu do carro com seus saltos altos como se fosse uma ginasta olímpica aterrissando de um salto twist carpado. Panthora nem se atreveu a olhar para trás. A porta da frente se abriu. A porta se fechou. |
A casa foi trancada. |
Sob a crescente luz da lua cheia, Cornelius se deparou embasbacado, com a mão ainda levantada como em súplica. Logo depois, sentiu o peso de um olhar sobre si. O vampiro abaixou o braço e girou o corpo, encontrando um par de olhos azuis faiscantes esgueirando-se por trás das cortinas roxas da casa ensombrada. Algo naqueles olhos, o brilho, o tom, a intensidade, o arrebatou ali mesmo. Eles eram tão intensos que ele não estava mais certo de que tinha julgado mal a situação com Panthora. Haveria ainda esperança para alguém que o olhasse de tal maneira, como se se arrependesse de alguma confusão ou infortúnio. |
Somente quando estava na metade do caminho para o covil, que Cornelius se lembrou que os olhos de Panthora eram castanhos. |
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